lunes, enero 31, 2011

Soneto

Tanto de meu estado me acho incerto
que, em vivo ardor, tremendo estou de frio;
sem causa, juntamente choro e rio;
o mundo todo abarco e nada aperto.

É tudo quanto sinto um desconcerto;
da alma um fogo me sai, da vista um rio;
agora espero, agora desconfio,
agora desvario, agora acerto.

Estando em terra, chego ao Céu voando;
num'hora acho mil anos, e é de jeito
que em mil anos não posso achar um'hora.

Se me pergunta alguém porque assi ando,
respondo que não sei; porém suspeito
que só porque vos vi.

- Luís Vaz de Camões